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Fisiologismos neoliberais de Abril

 Chamou a atenção uma reportagem que li, num exemplar da revista Exame, de 03/10/2012, em que tentava mostrar - claro, o que temos de pior -, típico de publicações da Editora Abril, onde seus editores procuram enfatizar suas qualidades de únicos e absolutos seres iluminados em meio aos tempos de trevas por que vivemos em nossos pífios números de nossa economia, demonstrados através da baixa produtividade do operário brasileiro. 

 Numa equação simplória, sobre gráficos meticulosamente bem ilustrados, tentou demostrar que um trabalhador americano sozinho, é capaz de produzir o equivalente ao resultado da produção de cinco operários brasileiros.

 Com um cuidadoso jogo de palavras e oximoros, a revista tenta relativizar a dureza das palavras contidas no texto, buscando 'isentar de culpa' o trabalhador, por sua baixa produtividade, argumentando que esse fato, não significa contudo que o trabalhador brasileiro trabalhe pouco, mas indiretamente faz uma alusão tosca da situação, ao comparar situações de trabalho no Brasil, na Alemanha e nos Estados Unidos, onde as relações entre capital e trabalho nos demais, está amplamente caracterizada pelo seu elevado padrão evolutivo e que no Brasil, ainda está muito aquém disso, onde no qual ainda se observa até mesmo, situações análogas à escravidão.

 Haja vista os questionamentos em outros veículos ligados à Editora Abril, que em tons de protesto estão constantemente contrários a uma proposta que tramita no Congresso brasileiro há pelo o menos uma década, que tenta implementar a redução na jornada semanal de trabalho de 44, para 40 horas, sem redução de salários. 

 Enquanto Exame, menciona o fato de os trabalhadores alemães trabalharem cerca de 36 horas por semana e produzirem quatro vezes mais que os brasileiros, e contando com regalias de 40 dias úteis de férias por ano.

 No Brasil, os malabarismos que as empresas fazem em relação às horas trabalhadas de seus funcionários, têm feito o trabalhador brasileiro, ficar entre 12 e 15 horas diárias à disposição da empresa onde trabalha. Em que as horas adicionais servem apenas para cobrir os descontos em folha, tais como: INSS, planos de saúde e odontológico. E ainda contam no máximo, com uma concessão média de férias de 20 dias úteis por ano (metade da dos alemães).

 Na reportagem de Exame, podemos observar as razões apontadas pela baixa eficiência na produtividade brasileira: 

 Dentre elas a baixa média de escolarização do brasileiro de 7,5 anos, enquanto o americano possui cerca de 12 ou 13 anos de tempo disponível na escola. Uma outra macabra estatística em torno disso, se dá pelo País ter somente 11% de sua massa trabalhadora ativa com diploma de graduação universitária, e que está estacionada à praticamente 30 anos nesse patamar.

 Segundo a matéria da revista Exame, uma empresa de softwares contratou 12 funcionários para o desenvolvimento de novos programas de computador nos Estados Unidos, enfatizando que no Brasil, isso seria quase impossível. Nisso podemos observar o extremo vira-latismo brasileiro que prega a incapacidade de nossa mão-de-obra, como meio de se justificar os baixos salários pagos no mercado de trabalho daqui.

 É importante salientar que muitos trabalhadores contam com uma remuneração equânime, segundo suas atividades e o grau de responsabilidade envolvido nela, visando com isso a sua plena oportunização na busca de uma graduação e uma profissionalização no meio onde ele já vem atuando. O que por sua vez, em boa parte dos casos, o mesmo não pode contar com a compreensão da empresa onde trabalha em torno disso. Uma situação que a qual pode sinalizar o descarte de talentos por parte das empresas, por puro capricho de seus diretores em relação ao seu staff.

 Num cenário extremamente desvantajoso e desestimulante ao trabalhador, o mesmo não encontrando motivação em continuar se dedicando por uma empresa que à qual não o valoriza, nem reconhece seu esforço, pode se ver envolto em verdadeiras encruzilhadas, no dilema quase que corriqueiro em sua vida profissional em continuar na empresa ou procurar algo diferente onde possa se sentir um pouco mais valorizado, e onde venha a conseguir atingir suas metas pessoais de qualificação naquilo que faz, através de seus rendimentos obtidos de seu trabalho.

 Certamente são razões mais propriamente peculiares como essas, que aliadas a situações de anos de baixa produtividade e ganhos sobre a inflação, acabaram por gerar no comportamento de um certo comodismo do empresariado brasileiro. Algo nefasto para ele próprio, ou mesmo naquilo que viria a ser como a assinatura da própria certidão de óbito de suas empresas, ancoradas no lucro fácil, nos tempos de inflação ou de surtos de valorização naquilo que comercializa, cotados internacionalmente. 

 Um outro trecho da reportagem que chama a atenção, se deve a situação que na Europa se caracterizaria num quase pleno emprego da massa trabalhadora nacional. 

 Com uma taxa de desemprego na faixa de 6% da população economicamente ativa, onde os salários obtiveram aumentos reais acima da inflação, não acompanhados desse aumento na eficiência na produtividade, os empresários brasileiros estão sendo levados a reverem suas teses e teorias sobre o jeitinho brasileiro de se produzir jabuticabas, mantendo a remuneração salarial baixa, em relação às economias desenvolvidas.

 Surge aí mais um indício da comparação tosca entre os mercados de trabalho e o nível de produtividade das empresas no Brasil, nos Estados Unidos e na Alemanha, onde seguramente nos dois últimos, a remuneração é bem melhor para os trabalhadores de lá - que são mais qualificados na verdade, porém mais conscientes de seus direitos e melhores organizados em seus sindicatos.

 Como exemplo, das péssimas condições de trabalho no Brasil, podemos citar uma outra reportagem na mesma edição da revista Exame, em que menciona o fato de duas funcionárias da BRF de Uberlândia, terem adquirido doenças ocupacionais no decorrer de três anos na empresa. 

 Uma delas, conseguiu seu primeiro emprego de carteira assinada com 28 anos em 2009 e que por conta dos 50 movimentos que fazia por minuto, adquiriu uma tendinite aguda e que por conta disso vive do auxílio-doença de R$ 800 por mês, para sobreviver com suas duas crianças e corre ainda, o risco de ter que se aposentar por invalidez, em seu curto tempo de contribuição à previdência. Ou seja, nós pagaremos por sua aposentadoria.

 Como a reportagem mesmo diz, esses casos estão longe de serem isolados. O Ministério Público do Trabalho (MPT) se defronta constantemente com situações em que funcionários ficam cerca de 8 horas em pé, exposição de horas a fio a temperaturas de cerca de 10 graus, e restrições até para o uso do banheiro, nos maiores frigoríficos brasileiros, recordistas nas exportações de carne.

 O MPT registrou só em 2010, mais de 30.000 casos de afastamento por motivo de doença - 12.000 deles por conta de movimentos repetitivos. E o pior, segundo um levantamento dos procuradores do MPT, atualmente algo em torno de 100.000 trabalhadores possuem algum tipo de doença ligada ao trabalho nos frigoríficos.

 Talvez por isso seja cada mais difícil para os frigoríficos conseguirem mão-de-obra para suas plantas. Segundo a revista Exame o Marfrig teria cerca de 2.000 vagas em aberto. 

 Já a BRF de Rio Verde, está apelando para a mão-de-obra disponível nas cidades vizinhas, disponibilizando fretamento de transporte para os possíveis interessados. 

 Contudo não se sabe se com o pagamento das horas in itinere, já que foi multada recentemente pelo MPT, devido ao tempo que seus funcionários - que mesmo morando em Rio Verde -, eram obrigados a perder, ao estarem à disposição da empresa num tempo médio de quatro horas entre a ida e a volta para casa. E por a mesma manter um rigoroso controle sobre a hora de entrada e saída de seus funcionários, computado apenas o tempo da produção de fato do funcionário.

 Sendo assim, os poetas iluministas neoliberais da Editora Abril, certamente por conta da superficialidade de suas matérias, estão longe de conseguir com isso, da parte dos empresários brasileiros, a plena valorização do capital humano nas empresas brasileiras, e prefere contudo, o fisiologismo tecnocrata das 'melhores' políticas de Estado,  tentando ensinar o governo a melhor via para isso, através de uma reforma na legislação trabalhista.

 Certamente o governo têm sinalizado nessa direção, portanto, não está insensível às dores dos empresários, mas também não perde a ótica de uma constante busca das distribuições das riquezas geradas pela nação através do nosso capital humano.

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