A semana que passou, bombou no mercado financeiro com a notícia das conversações entre duas das maiores fabricantes de aviões do mundo, que giraram em torno de uma possível aquisição de uma pela outra: a americana Boeing que sugeriu a compra da brasileira Embraer e provocou um verdadeiro frisson em meio ao alvoroço eufórico no mercado, com a valorização de 23% das ações da companhia brasileira fabricante de aeronaves.
Exatamente por isso, as opiniões das redes sociais se dividem, mas a predominante se deu entre aquela que acredita cegamente que toda e qualquer transação entre uma empresa brasileira e outra americana, seja confiável e não tenha nenhum problema. De forma espontânea e natural, os mais radicais dentre os partidários e admiradores de uma realidade idealizada de livre mercado em que houvesse pouca ou quase nenhuma participação estatal, foram os mais entusiasmados com a notícia.
E-195, um dos últimos lançamentos no seguimento de jatos comerciais da Embraer (Foto: embraer.com).
|
Criada em pleno regime militar pelo governo brasileiro da época, a Embraer surgiu em 1969 como sociedade de economia mista, vinculada diretamente ao Ministério da Aeronáutica, tendo já como primeiro produto disponibilizado ao mercado a aeronave EMB-110 Bandeirante o qual teve sua produção iniciada em 1973. O projeto do Bandeirante já estava pronto antes mesmo da Embraer existir e a necessidade da criação da empresa como tal, surgiu em função de se tornar possível o financiamento do projeto em escala de produção comercial.
Notadamente por todo esse histórico, a Empresa Brasileira de Aeronáutica S/A, nasceu com fins militares, mas nada que lhe impedisse posteriormente de atuar no seguimento de aviação civil. Nos anos 1980, o projeto de um caça-bombardeiro por meio de um consórcio entre empresas italianas e a Embraer, se fez como um importante marco no salto tecnológico para a então estatal brasileira fabricante de aviões, por meio do projeto AMX, o qual alcançou relativo sucesso de vendas e atendeu bem as expectativas de ambas as empresas.
O sucesso obtido pela Embraer em seus primeiros anos, não teria sido possível sem o homem-chave em todo o seu processo de consolidação; Ozires Silva, que além de co-fundador da Embraer, presidiu a entidade por um longo período, também teve participação executiva majoritária na Petrobras e na Varig. O próprio Ozires Silva, que hoje se encontra no alto de seus 86 anos, também contribuiu no processo de privatização da própria empresa que ajudou a criar, entre os anos de 1991 e 1994.
Concluído o processo de privatização, a Embraer entra em uma fase de reestruturação e acaba se tornando, já na década de 2000, a terceira maior fabricante de aviões destinados a aviação regional do mundo, se destacando ainda no ramo de aviação agrícola com o modelo Botucatu e o Ipanema, o primeiro avião movido à álcool do mercado. Ainda na década de 2000, a Embraer se viu em uma de suas maiores disputas comerciais contra a rival canadense Bombardier.
O governo do Canadá chegou até a espalhar o boato de que o rebanho bovino brasileiro, estaria infectado com a doença da vaca louca (talvez na tentativa de uma referência superficial à febre aftosa), mas que indiretamente visava afetar o Brasil em retaliação à iniciativa do governo brasileiro da época contra os subsídios governamentais canadenses disponibilizados a Bombardier e por também já se sentir incomodado com o avanço do mercado exportador brasileiro de carnes.
A disputa comercial que chegou até a Organização Mundial do Comércio (OMC), teve porém, as duas partes condenadas pela corte de conciliação de comércio internacional por entender que a Embraer também era beneficiada com subsídios do governo brasileiro na época.
A Embraer ainda coroaria sua trajetória com o lançamento de aviões comerciais, destinados a aviação regional de médio porte com a linha ERJ e após isso, até evoluir para os atuais modelos E-Jets, como o E-190 e o E-195, o avião cargueiro militar KC-390, além é claro, dos caças Super Tucano, que sem dúvida, trata-se do maior sucesso da companhia.
Em 2014 o governo brasileiro assinou contrato com a empresa sueca Saab, após um longo processo concorrencial o qual escolheria novos caças supersônicos para a Força Aérea Brasileira destinados ao patrulhamento do espaço aéreo nacional, para fabricação dos jatos bélicos Gripen, que no Brasil serão montados pela Embraer e o que agregará muito a empresa. O contrato entre a Embraer e a Saab foi confirmado em 2015, no qual prevê a transferência de tecnologia do Gripen pela fabricante de armamentos de uso militar sueca a Embraer.
E é exatamente por conta de toda a trajetória militar envolvendo a Embraer, que não se trata de um bom negócio para a empresa, vir a ser adquirida pela Boeing, muito menos ainda para os interesses do Brasil e seus parceiros. Há segredos militares envolvidos numa transação como esta, que precisam ser preservados; sem o respeito a essa parte que toca à soberania brasileira, a transação com a Boeing se faz inteiramente arriscada e pouco confiável.
São contextos como estes, que os liberais de ocasião ignoram, infelizmente também, algo entendido pelo próprio fundador da Embraer, Ozires Silva. Para ele (conforme apontou o portal G1), o interesse da empresa americana pela Embraer seria razão de orgulho. O governo brasileiro porém inicialmente se manifestou contrário à possibilidade de compra da Embraer pela Boeing.
São contextos como estes, que os liberais de ocasião ignoram, infelizmente também, algo entendido pelo próprio fundador da Embraer, Ozires Silva. Para ele (conforme apontou o portal G1), o interesse da empresa americana pela Embraer seria razão de orgulho. O governo brasileiro porém inicialmente se manifestou contrário à possibilidade de compra da Embraer pela Boeing.
Por outro lado, como se torna necessário o aval do governo para que a transação seja feita, existe o "obstáculo" estatal o qual se faz como o maior foco de críticas dos liberais idealizadores (em torno do que entendem como concorrência pura e perfeita). Entretanto, a preocupação do governo se dá na perda total do controle acionário nacional da Embraer, atualmente composta pelo BNDESpar, com 5,4% das ações e a Previ com 4,8%. Além da participação brasileira, estão os estrangeiros Brandes Investments Partners (15%), Mondrian Investments Partners (10%), e o Blackrock com 5%, conforme divulgado pela BBC Brasil.
Só resta agora o amadurecimento de todo esse processo e se o que está verdadeiramente por trás de tudo isso, também estariam segredos militares obtidos com a aquisição pela Boing, cedidos ao governo americano de graça.
Só resta agora o amadurecimento de todo esse processo e se o que está verdadeiramente por trás de tudo isso, também estariam segredos militares obtidos com a aquisição pela Boing, cedidos ao governo americano de graça.
Além de tudo, é preciso saber o que a própria Saab acha de uma transação como esta e o que de fato pode estar envolvido além do motivo óbvio alegado de fusão da Airbus e a Bombardier, com o futuro de ambas as companhias americana e brasileira. Logicamente com a possível evolução das negociações, a Saab também viria participar delas, que contudo até o momento, os brasileiros ávidos pelo entreguismo desvairado e sem qualquer critério, não se deram conta para tudo isso, mesmo que se trate de uma empresa já devidamente privatizada, de prestígio, competitiva e altamente lucrativa como a Embraer.
Comentários
Postar um comentário