Pular para o conteúdo principal

Encarceramento em massa e a receita de uma sociedade fracassada

 O Brasil enfim conseguiu seu grande feito e se tornou a terceira maior população carcerária do mundo, basicamente formada por negros, pardos, analfabetos e pobres; pessoas às quais muito pouco se ofereceu em oportunidades para saírem de suas vidas de delinquência, mas que ainda são cobradas por aquilo que a sociedade deixou de fazer por elas. Afinal a imagem do pedreiro sem pernas que ainda trabalha, é o argumento confortável perfeito para as classes dominante e média, enfatizarem que não existem "vítimas da sociedade".

 Com pouco mais de 720 mil presos a segunda maior economia das Américas demonstra que a intolerância, a exclusão e a discriminação ainda passam despercebidas quando são sutilmente abordadas de modo dissimulado sob o discurso legitimado (à força, é claro), da necessidade de ações coercitivas duras para conter a criminalidade. 

 Portanto nada mais se trata o que exprime o lado obscuro da classe dominante que teima em dividir a sociedade entre vencedores e fracassados, apenas para que ela se mantenha na posição de "vencedora" quando parte para o recurso da recriminação o qual procura projetar seu próprio jogo preguiçoso nos pobres na atribuição da preguiça apontada pela burguesia a eles, como fator que caracteriza a pobreza e a baixa bagagem intelectual que os evidenciam como "fracassados". 

 Dentro dessa retórica da necessidade sentida pelas altas classes em diminuir os pobres, os negros e os analfabetos com a criminalização e o encarceramento em massa, a sociedade dominante despótica dita "esclarecida", impõe sua vontade através do medo e em seu uso como principal instrumento de intimidação. Nem que para isso, se utilize também de meios escusos e pouco ortodoxos para fazer valer na marra, a tese de que existe tal demanda e se faz indispensável a mobilização de entidades, para debelar pessoas vistas como..., "do mal". 

 Esse entendimento também corrobora para o desmentido de teorias que exaltam a meritocracia, uma vez que ao se adotar o recurso de criminalização dos pobres - simplesmente como meio de retira-los do jogo da competitividade social eliminando seus espaços de manobras que permitissem a eles se sobressaírem no meio social -, as ditas classes abastadas em que predomina o domínio econômico e discursivo, acabam por assumir que possuem competência limitada dentre a livre iniciativa e a concorrência que tanto defendem.

 Nessa mesma compreensão de que se é preciso manter a política de encarceramento em massa delimitada aos pobres, um grupo de pessoas ligadas a entidades classistas patronais que tomaram o poder em Rio Verde, decidiu afrontar até mesmo o parágrafo único do artigo 87 da lei federal de Execução Penal ao resolverem construir eles mesmos, a nova unidade prisional rio-verdense em conjunto com o poder público do município.

 Tudo após se verem impotentes frente as inúmeras visitas inócuas ao governador, no sentido de sensibiliza-lo a propiciar a retirada da Casa de Prisão Provisória do centro da cidade, que por sua vez acabou configurando-se numa decisão que expressa a fragilidade de articulação, do poder de lobby, da ausência de traquejo político e de enfrentamento adequado das questões que tocam à péssima representatividade do município de Rio Verde junto ao governo estadual goiano.

 Prefeito Paulo do Vale e o presidente da Associação Comercial e Industrial de Rio Verde (Acirv), Ivo Marques Júnior - ambos sem terno -, ao lado de autoridades engravatadas do Ministério Público e do Judiciário local em mais uma solenidade ligada a construção da unidade prisional sob "tutela" do município de Rio Verde (Foto: assessoria do vereador José Henrique de Freitas).  

 Algo que na melhor das hipóteses se fizesse como moeda de troca em que o governador Marconi Perillo venha a pagar caro eleitoralmente em Rio Verde, por ter sido tão negligente frente aos interesses do município naquilo que compete ao governo de Goiás viabilizar. No entanto, esse cenário não reflete nada mais que um devaneio futurista do que poderia vir a acontecer, se a classe empresarial e política rio-verdense viesse a retribuir reciprocamente o tratamento do governador.

 Em meio a frágil conjuntura política da total ausência de prestígio junto ao governo do estado, a classe patronal de Rio Verde assumiu que pretende mesmo por em marcha seu projeto de encarceramento em massa de pobres, pouco se importando com estatísticas da realidade prisional que envergonha o Brasil no cenário internacional que por sua vez o caracteriza como um país intolerante, segregacionista e que por oferecer poucas oportunidades às pessoas, prefere encarcera-las, tornando-as como inimigas da sociedade. 

 Nesse contexto a classe dominante exalta o que tem de pior em si mesma, todo o preconceito e discriminação evidenciados na política de criminalização dos pobres.  

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Rio Verde moderna

 Dando seqüência ao último post, em comemoração ao aniversário de 164 anos de Rio Verde, no próximo dia 05 de agosto, vamos iniciar de onde paramos: a década de 1960, quando relatei que a cidade enfim, inebriava-se num breve período onde a dupla Mauro Borges (governador do Estado) e Paulo Campos (prefeito), inaugurava uma fase onde o centro de Rio Verde passava por sua modernização.   Ruas de terra ou calçadas com paralelepípedo em basalto davam lugar ao asfalto. O paralelepípedo teve uma outra destinação, e foi usado como guias de sarjetas das novas ruas recém-pavimentadas.  Os postes que sustentavam a rede de energia elétrica de aroeira, deram lugar a modernos postes de concreto e uma iluminação pública mais potente ganhava as ruas da cidade. Tudo da energia provida de Cachoeira Dourada.  Conta-se que a primeira rua a ser pavimentada foi a Rua João Belo, (atualmente, Rua São Sebastião no centro antigo de Rio Verde). E o asfalto ficou tão bom, que a necessidade de recapeamen

Um nome estranho; um bairro que nasceu para ser "setor"

Para quem já se 'cansou' de ler sobre a história do nosso município que nesse finalzinho de agosto -celebra seu mês de aniversário-, deve portanto saber, que a chamada "arrancada para o desenvolvimento" de Rio Verde, se deu a partir dos anos 1970.  O certo, é que a cidade seguiu o ritmo do tal "milagre econômico" dos governos militares daquela época. Mas sem dúvida, o que foi determinante em tudo isso, se deu com a fundação da Comigo, no ano de 1975.  Desde o final da década até o início dos anos 1980 porém, a expansão urbana de Rio Verde também sofreu um elevado aumento, sendo que essa situação provocou o surgimento de bairros cuja a única infraestrutura disponível, se deu somente na abertura de ruas e o traçado das quadras.  A especulação imobiliária por parte dos herdeiros de propriedades antes rurais, que margeavam os limites urbanos da cidade, abriu espaço para bairros onde atualmente se verifica sobretudo, a apertura das ruas, em que muitas delas nã

Globalismo Vs nacionalismo e o futuro da humanidade

O mundo sempre viveu conflitos entre interesses privados e coletivos; mas apesar de ser um termo novo o globalismo por sua vez, teve papel preponderante nisso, logicamente adaptado aos contextos de suas épocas.  Antes, na antiguidade, as primeiras civilizações já eram globais e dominavam outras, pela força. Não que hoje os métodos de dominação tenham mudado, porém para isso, se tornaram mais sutis, e não menos violentos.  Desse modo, a sensação de violência sofrida é que pode demorar algum tempo para ser sentida; o que não ocorre de maneira uniforme por todas as populações subjugadas.  Sem falar na corrupção, a maior aliada dos dominadores contra os subjugados. Assim, pessoas do lado dos oprimidos, se veem partidárias de seus opressores, em nome de possíveis vantagens pessoais adquiridas. Alexandre, o primeiro grande conquistador, certamente de modo involuntário, foi o primeiro a difundir o globalismo, através de seus exércitos. Porém, conforme diz sua história, ele teria chorado por n