O desafio brasileiro é imenso, mas infelizmente, nossas autoridades parecem apenas manifestar o desejo de fazer prevalecer seus posicionamentos ideológicos por puro narcisismo e vaidade, do que propriamente algo substancial que venha proporcionar progresso e prosperidade a todos, com estabilidade política e econômica.
Nesta esteira, o governo apresenta o mundinho fácil dos gastos públicos, como método mais rápido de alavancagem da economia e promover assim, crescimento do PIB*.
Como se sabe, o crescimento da economia é essencial para se mudar a realidade social de um país; sem isso, os índices de pobreza tendem a aumentar substancialmente no decorrer do tempo, como de fato ocorreu no Brasil, nos últimos doze anos.
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Comunidade de Paraisópolis com prédios ao fundo do bairro do Morumbi, na capital paulista; foto ilustra a imensa desigualdade social no Brasil - Foto: Reprodução. |
Nesse aspecto é importante observarmos a necessidade de uma política que equilibre essas duas visões, pois pelo lado do gasto público, se houver cortes muito severos, também pode haver comprometimento do crescimento da economia; porém, se os gastos forem exagerados demais, a inflação pode comprometer todo o ganho alcançado com o crescimento obtido.
Em 2022, o gasto de consumo do governo nunca foi tão baixo, chegando a atingir o menor nível da série histórica de 18% do PIB. Em 2016 esse percentual chegou a 20,4%. É importante lembrar que este gasto em específico, não contempla outros tipos de despesas governamentais.
Alguns economistas acham que este seja um dado positivo, pois em tese, abre espaço para o governo reduzir impostos, aumentando o poder de compra do brasileiro, o que também estimularia o consumo e o crescimento da economia.
Por outro lado, uma distinta parcela de especialistas, acreditam que gastos governamentais também estimulam o PIB.
Gastos como transferências de renda ou obras, são computados de modos diferentes no cálculo da participação do governo no estímulo para o crescimento do PIB. O gasto sobre o consumo se dá essencialmente nas despesas públicas com insumos (basicamente em sua maioria, importados) e pessoal, nas áreas de: saúde, educação e segurança pública.
Crescimento do PIB como fator principal de redução da pobreza
O economista Pepa Silveira, convidado de um podcast no YouTube, elencou que redução da pobreza se dá com crescimento da economia; nisso ele está cabalmente certo. No entanto, Pepa citou alguns elementos superficiais como redução do gasto público e dos impostos, como ingredientes para se alcançar patamares de crescimento do PIB.
Este é o discurso fácil de liberais, os quais acreditam que somente redução de impostos e corte de gastos, sejam suficientes para se alcançar taxas de crescimento substanciais, acima de 3,5% ao ano.
Porém, o grande desafio é fazer o PIB crescer mais que a inflação, não apenas em um único ano, mas por dez, quinze, vinte ou vinte e cinco anos ininterruptos -uma preocupação que não deveria ser apenas de gestores de fundos da Faria Lima com relação ao peso da inflação sobre os investimentos de seus clientes.
Somente com crescimento igual ou maior que a inflação, o Brasil assim, reduziria consideravelmente seus índices de pobreza em sua população.
E para isso, a inflação anual na casa de 5,8%, com crescimento médio (hipotético) de 3,5% ao ano, não há mudança no retrato social de qualquer país. Seria necessário ao menos trazer as taxas de inflação, para mais próximas das taxas de crescimento do PIB e o caminho para se alcançar isso é controverso.
Pepa critica ainda, os desenvolvimentistas na defesa apaixonada que fazem ao redor da reindustrialização (Já que a desindustrialização se trata de um fenômeno que ele entende como global e não apenas brasileiro), e no papel do Estado Nacional ao redor desse propósito.
Porém, ele não diz que as economias industriais tradicionais, possuem mecanismos muito efetivos de proteção à sua indústria, além de apostarem novamente em incentivos para voltarem a ter protagonismo industrial, fazendo frente à hegemonia chinesa no setor; e que o ritmo de desindustrialização brasileiro é bem mais acelerado e severo que em outras partes do mundo.
Pepa Silveira, citou dados científicos de observação empírica, que em tese comprovariam o que ele mencionou sobre redução de impostos e gastos públicos como ingredientes para se fazer o PIB crescer. No entanto, ele não citou sobre fatos históricos nacionais em que apontam o Brasil como o país que mais cresceu entre 1940 e 1980, mas não reduziu seus índices de pobreza.
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O investimento em infraestrutura é primordial para o o país seguir crescendo de modo sustentável e contínuo - Foto: Ministério da Infraestrutura. |
Crescimento e concentração de renda
Tanto que no período do milagre econômico brasileiro, durante os primeiros anos do regime militar (1969-1973), o tema esquentou bastante com a "teoria do crescimento do bolo", quando a economia crescia a taxas de 11%, 13% e até 14% ao ano, mas com inflação de 18% a 20% anuais.
Nesta observação, além do imposto inflacionário, os mais pobres no Brasil sempre sofreram com a chamada regressividade tributária, onde o modelo de cobrança de impostos, acaba penalizando mais quem ganha menos; beneficiando a parcela da população da ponta oposta, onde aqueles que pagam menos impostos, são exatamente os que ganham mais.
Estes são fatores que indicam a forte concentração de renda nacional (seja em que cenário for: recessão ou crescimento), dentre populações daquele tempo, ou de agora, às quais não tinham (ou não têm), meios de se beneficiar do crescimento da economia, ao mesmo tempo em que pudessem se proteger da inflação.
Sem falar ainda, nas taxas de juros do varejo bancário, praticadas; onde o brasileiro que recebe seu salário já tem debitado pelo banco, juros por uso de limites do cheque especial ou do cartão de crédito que variam a taxas de 180% a 290% respectivamente, dentre as duas modalidades de crédito citadas.
Agora a reforma tributária em discussão no Congresso Nacional, simplesmente desonera empresas e empurra toda a carga de impostos sobre o consumo da massa salarial brasileira, em média, composta por 80% com rendas de até R$ 2.300 mensais.
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Setores de alta tecnologia, como o de semicondutores, são essenciais para o Brasil garantir longos períodos de crescimento sustentável da economia - Foto: Reprodução. |
Portanto, crescimento do PIB somente, não garante redução da pobreza; além de corte de gastos e de impostos, não garantirem crescimento econômico, se a ideia for continuar isentando os mesmos que já pagam pouco e ganham muito.
Isto é, o problema é distributivo, pois dentre os dois aspectos: do aumento do gasto público (de um lado, do ponto de vista heterodoxo) ou de corte de gastos e redução de impostos (de outro -pela linha liberal), o que impera nas entrelinhas, é a teoria do gotejamento, onde se acredita que medidas adotadas que beneficiem os mais ricos, de alguma forma, termina beneficiando também os mais pobres, o que nada mais se trata, de pura falácia.
Dessa forma, o governo acredita que investindo em obras públicas, através da contratação de empresas de engenharia para executa-las, (ou pressionando o Banco Central para reduzir juros), gerariam empregos.Através da visão liberal de corte nos impostos, é importante lembrar que o país já renuncia anualmente a cerca de R$ 416 bilhões em benesses tributárias, cerca de 4,6% do PIB, sem que isso seja garantia de que a economia brasileira tenha crescido mais, neste período.
Para se alcançar o patamar ideal que mantenha preços sob controle e crescimento da economia, o primeiro passo, seria garantir a formação de poupança interna para investimento, reduzindo a demanda do Estado Nacional por financiamento privado, por meio da emissão de dívida pública.
Isso poderia ser obtido facilmente com uma lei que garantisse a totalidade da mineração de metais nobres em reservas indígenas sob os cuidados da União, onde o produto minerado extraído fosse direcionado tanto para o Tesouro Nacional, quanto para a formação de reservas de lastro de moeda, ao Banco Central.
Além da reformulação de fundos como o FGTS e o FAT, no financiamento da formação técnica para a qualificação de mão de obra, e o redirecionamento de outros para investimentos em infraestrutura como FUST e FUNTTEL (das telecomunicações).
Outra medida importante para melhorar o conflito distributivo, é a adoção de um modelo tributário onde os ricos sejam mais tributados que os pobres, fazendo a inversão de uma tributação (mais voltada para o patrimônio, lucros e dividendos, grandes heranças e as altas rendas), e menos sobre o consumo das massas.
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Para o país crescer de modo substancial, é essencial o investimento em cursos técnicos gratuitos para formação de mão de obra especializada - Foto: Reprodução. |
A adoção de uma política de Estado para compras governamentais onde a indústria nacional seria a mais beneficiada, no sentido de direciona-las ao mercado doméstico, estimulando a reindustrialização nacional através deste meio, onde setores como defesa, saúde, educação e infraestrutura, seriam contemplados.
Além de uma política de incentivos tributários, mais metódica e cartesiana, que atenda de sobremaneira, a setores realmente relevantes do ponto de vista estratégico para a economia nacional, como o de autopeças (para reduzir a dependência de importados) e de alta tecnologia, como semicondutores.
Investir em mais escolas de formação técnica com o fortalecimento do Sistema "S", com a instalação de cursos técnicos de nível superior, totalmente gratuitos, além da concessão de incentivos a empresas que ofereçam estágios com garantia de contratação efetiva de alunos.
O falso dilema Estado Vs iniciativa privada
Desse modo, é necessário, o papel do Estado como indutor do desenvolvimento, através de políticas públicas que conduzam a iniciativa privada a esse fim; com métodos que desestimulem vícios de agentes econômicos preocupados apenas na angariação de lucros e na premiação de outros, que realizem investimentos que se traduzam em empregos de qualidade e bons salários, os quais impactem positivamente na massa de consumo doméstica nacional.
Mas Pepa Silveira também acredita, que no cenário atual, a taxa de desemprego (apesar de reconhecidamente alta), está em seu nível de equilíbrio e que por isso, não pode se reduzir mais do que já o foi até hoje; ou seja, em um patamar confortável onde não há risco de inflação.
Algo que desmente um pouco sua suposta preocupação com o crescimento econômico, como instrumento de redução da pobreza, pois é exatamente através da massa salarial, que as pessoas ficam menos pobres, surgindo o dilema da inflação que corrói ganhos dos investimentos da Faria Lima.
E este é outro problema distributivo que passou longe do debate liberal de podcast, pois crescimento econômico sustentável só ocorre por meio de investimentos das empresas em seus processos produtivos e no capital humano disponível a elas.
Isso por sua vez, aumenta o nível de produtividade per capita do trabalhador e com ele, o crescimento do PIB, onde os salários seriam reajustados somente sob essa condição e não na reposição de perdas inflacionárias como é atualmente.
Além disso, é impossível prover crescimento econômico com uma estrutura tributária, que na prática, tira dos pobres para dar aos ricos, reduzindo o gasto público ao ponto de mutilar a economia, ao retirar o importante papel do Estado nesse propósito (uma mentalidade existente somente entre liberais do Brasil).
*PIB é o acrônimo para Produto Interno Bruto; trata-se da soma de todas as riquezas produzidas por uma economia (seja ela, municipal, estadual ou nacional), em um determinado período de tempo.
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