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Da "zona de conforto" ao Burnout e o quiet quitting

De coachs a vendedores de cursos pela internet, e até tarólogos, todos são enfáticos e por vezes recomendam às pessoas (às quais estejam ainda, vivendo momentos infernais em suas vidas) a "saírem de suas zonas de conforto".

Com a competição interpessoal cada vez mais acirrada, a abordagem errada de um diagnóstico feito por "especialistas", pode comprometer psicologicamente a saúde mental de quem se arrisca a ouvi-los.

Principalmente em ambientes onde a competição é sempre instigada, a qualidade das relações entre as pessoas, acaba se comprometendo. 

E por mais que haja o discurso de que os ambientes de trabalho sejam familiares, é sempre importante lembrar, que nas melhores famílias, as relações também podem ser densas e bastante carregadas.

As empresas por sua vez, se dizem preocupadas com os efeitos negativos que a elevada competição entre seus funcionários, poderia acarretar na saúde mental de boa parte do seu capital humano. 

Porém, muito pouco de modo efetivo, é feito da parte de suas diretorias no sentido de atenuar conflitos que terminem por trazer danos psicológicos a seus colaboradores. 

Além disso, o discurso de suposta preocupação empresarial com o bem estar de funcionários, logo é desmentido com metas absurdas a serem obtidas e pressões de todos os tipos, para o alcance de resultados. 

Muitos trabalhadores por outro lado, sabendo que as metas estabelecidas são quase impossíveis de serem cumpridas, partem para abordagens alternativas, onde começam assim, a observar comportamentos alheios, como modo de identificarem possíveis desvios éticos comprometedores.

Dessa forma, buscam eliminar concorrentes internos e assim, se destacarem frente aos demais.

Atitudes como apontadas acima, logicamente são desonestas, e além disso, afetam de modo muito nocivo, as relações de trabalho entre colegas. 

Muito difícil portanto, a persistência na afirmação de que uma boa parcela de pessoas, vivam em situações confortáveis, onde qualquer vacilo, por mínimo que seja, pode ser razão suficiente para repreensões, punições ou até mesmo, demissões. 

Desse modo, a tensão entre profissionais acaba ficando cada vez mais intensa, afetando logicamente na qualidade emocional de quem se vê obrigado a conviver em ambientes extremamente hostis, de rivalidade e desconfiança mútua

Sendo assim, o sujeito percebe a necessidade de ficar sempre na defensiva, em qualquer ocasião, até mesmo, se estiver fora de seus ambientes de trabalho, ainda que sejam em situações de descontração e lazer.

Com o passar do tempo, a permanência de situações complicadas que se perpetuam e o cumprimento das metas estipuladas às equipes, se mescla a cizânias cada vez mais acirradas entre colegas de trabalho, causando desgaste emocional.

Isso por sua vez, leva ainda, ao esgotamento físico, o qual na atualidade pode ser diagnosticado como um novo tipo de doença ocupacional. 

Burnout

De acordo com o Ministério da Saúde, a Síndrome de Burnout (ou Síndrome do Esgotamento Profissional) é um distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico, resultante de situações de trabalho desgastante, que demandam muita competitividade ou responsabilidade. A principal causa da doença é justamente o excesso de trabalho.

A etimologia da palavra Burnout, é originada nas expressões inglesas "burn" (queima) e "out" (exterior), o que nos remete à ideia de "queima externa".

A ideia de "queima" é o que melhor pode definir a Síndrome de Burnout - Foto: Reprodução.

Por vezes, é exatamente isso o que adversários esperam como fim de seus oponentes nos ambientes laborais: como se quisessem "queima-los" (porém, esta alusão está mais relacionada ao contexto do comprometimento da reputação deles, mas que na verdade, termina ocasionando em reações adversas de cunho emocional).

Ainda de acordo com a definição do Ministério da Saúde, a Síndrome de Burnout, também ocorre quando o profissional entende que é incapaz de cumprir tantas exigências que lhes são impostas pela empresa, pautadas em objetivos muito difíceis. 

Sintomas

A Síndrome de Burnout envolve nervosismo, sofrimentos psicológicos e problemas físicos, como dor de barriga, cansaço excessivo e tonturas. O estresse e a falta de vontade de sair da cama ou de casa, quando constantes, podem indicar o início da doença.

Os principais sintomas da Síndrome de Burnout são:

  • Cansaço excessivo físico e mental
  • Dor de cabeça frequente
  • Alterações no apetite
  • Insônia
  • Dificuldades de concentração
  • Sentimentos de fracasso e insegurança
  • Sentimentos de incompetência
  • Alterações repentinas de humor
  • Isolamento
  • Fadiga 
  • Pressão alta
  • Dores musculares
  • Problemas gastrointestinais
  • Alteração nos batimentos cardíacos

Normalmente estes sintomas se apresentam de forma leve, mas tendem a se agravar com o passar do tempo, sendo por isso, algo visto como passageiro, por quem os sofre; o que as impede de inicialmente, procurarem apoio profissional. 

Por outro lado, algumas pessoas tentam evitar ficarem doentes tomando atitudes equivocadas reciprocamente hostis, na mesma proporcionalidade com que são tratadas; isso, no entanto, agrava suas reputações e consequentemente, futuras tentativas de se reenquadrarem em outras empresas.

Outros preferem suportar de modo resiliente, pressões e hostilidades, para assim, pouparem suas identidades se livrando de possíveis futuros estigmas morais, mas sacrificando suas saúdes emocionais. 

Existem ainda, aqueles que buscam em técnicas de meditação, ou práticas de yoga, meios de conseguirem equilíbrio emocional para lidarem com os percalços do cotidiano, essencialmente nos ambientes familiares e de trabalho.

Abordagem do Burnout na mídia

A grande mídia corporativa tradicional tende a fazer uma abordagem da Síndrome de Burnout um tanto condescendente com as empresas e a culpar as vítimas, às quais são apontadas como as próprias responsáveis por adquirirem a doença, em função de assumirem mais atribuições e trabalho, acima do que podem suportar.

Algo também visto como próprio de um grupo de pessoas que às quais, de certo modo, querem "abraçar o mundo", ou "mudar o mundo"; dando o máximo de si, em um primeiro momento, para depois, desfrutarem dos possíveis êxitos e sucessos, por meio de uma vida tranquila e segura, do ponto de vista financeiro e social.

É nesse aspecto que as empresas são levadas a contratar "especialistas" de modo eventual, onde funcionários são reunidos para serem conscientizados em palestras, e que logo após, os mesmos funcionários são coagidos a apresentar resultados, dentre as condições mais adversas, e onde o conteúdo das palestras, passa a ser ignorado e até esquecido, em pouco tempo. 

Quiet quitting 

Há uma outra parcela de profissionais os quais têm optado por uma forma de abordagem profissional, que além de mais pacífica, ajuda a preservar a saúde emocional e que tem sido tendência mundial, principalmente em sociedades mais desenvolvidas que a brasileira, o "quiet quintting".

O termo também originado do inglês, se refere a trabalho silencioso, ou que se restringe a fazer somente o que é realmente necessário ou indispensável; em casos mais extremos, os profissionais pedem demissão e dependendo da situação e do ambiente, os pedidos de demissão podem ocorrer em massa.

As empresas por sua vez, têm se antecipado à isso e elas próprias demitindo pessoas que estejam apenas cumprindo o básico ou o mínimo de suas obrigações; foi o que aconteceu no setor de tecnologia com as big techs do Vale do Silício na Califórnia, Estados Unidos.

Com o trabalho remoto, no decorrer da pandemia de Covid-19, as pessoas passaram a valorizar mais a saúde mental, do que o foco demasiado no alcance de objetivos corporativos - Foto: Ilustração/ Nez Riaz/ Verywell.
Recentemente, dezenas de pessoas foram demitidas; as big techs porém, alegaram corte de custos. Isso em um setor que nunca reclamou de crises e que sempre pagou os melhores salários, além de se queixar da falta de mão de obra especializada.

Críticas ao quiet quitting

O filósofo Luiz Felipe Pondé, durante uma de suas participações cativas no programa Linhas Cruzadas da TV Cultura de São Paulo (disponível no YouTube), disse que o fenômeno de jovens que pedem demissão das empresas onde trabalham, se deve a um grupo de pessoas que podem se dar à esse luxo, pois certamente sabem que serão sustentados pelos pais.

Pondé associa esse fenômeno mais como tendências ancoradas no marketing de causa, localizadas em bolhas sociais ou algo assemelhado ao que se entende como "pautas identitárias" de militância sem propósito claro e definido.

A visão de Pondé, pode estar alinhada ao meio de classe média alta paulistana e que difere um pouco da realidade dos funcionários demissionários nas big techs da Califórnia, onde as decisões de pedidos de demissão, podem resultar em opções de vida indigente de sem tetos; algo que tem aumentado muito na realidade dos Estados Unidos, nos últimos anos.

No entanto em outro programa onde o Burnout é discutido, o quiet quitting como forma de defesa para se evitar a doença, nem sequer é mencionado. 

Outro risco, conforme apontado por Pondé, é as pessoas procurarem meios de cura através de um mercado o qual vem crescendo ano após ano, que é da busca pelo auto conhecimento, da espiritualidade com meditação e yoga, que não propriamente prometem cura, mas imputam, de novo, a responsabilidade pela cura, na própria pessoa. 

Isto é, um novo tipo de pressão disfarçada "do bem", para a melhora da pessoa adoecida.

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