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Milton Friedman: Quem foi o teórico que desbancou o pensamento keynesiano em plena vigência do Plano Marshall

Apesar de ter nascido no ano de 1912 em Nova York, Milton Friedman, ficou conhecido como o homem de Chicago; além de ganhador do Prêmio de Ciências Econômicas, concedido pelo Banco Central da Suécia, em 1976, em memória de Alfred Nobel, criador do Prêmio Nobel, por seu estudo sobre análise do consumo e história da teoria monetária.

Foi entusiasta do conceito de "moeda fiduciária", termo que designa o valor do dinheiro (ou quaisquer tipos de títulos monetários) expresso na confiança, observada em outros parâmetros, que não apenas no lastro de conversibilidade em um metal nobre, no caso, a prata ou o ouro.

Friedman se formou em matemática e economia na Universidade Estadual Rutgers, em Nova Jersey, pois tinha interesse em atuar no mercado de capitais. 

O ano era 1932 e os Estados Unidos atravessavam o início do período mais complicado do capitalismo mundial, chamado de "Grande Depressão" (crise iniciada pelo episódio conhecido como "Crash da Bolsa de Nova York" em 1929, e que durou até 1941).

Influenciado pelo momento econômico vivenciado por seu país, Milton Friedman, foi convencido por dois de seus professores a adotar a profissão de economista, pois acreditavam que a economia moderna, pudesse ser instrumento para terminar com a Depressão.

Milton Friedman (1912-2006): o guru liberal que conquistou o coração de muitos e a antipatia de keynesianos e "austríacos" - Foto: Associated Press/ AP.

Em 1933, ele se especializa na instituição pela qual ficaria conhecido no mundo todo, a Universidade de Chicago. Ciente de que não conseguiria um emprego na área acadêmica, se muda em 1935 com seu amigo, para a capital dos Estados Unidos, Washington, onde consegue um emprego público. 

Foi nesse período que ele conheceu de perto, o plano de recuperação econômica do presidente democrata Franklin Roosevelt, conhecido como New Deal (Novo Acordo), conduzido pelo economista britânico, John Maynard Keynes. 

Friedman, mais tarde se tornaria um ferrenho opositor do plano de Keynes. 

Dizia concordar com o programa de criação de empregos em obras públicas, de resto, Friedman se opôs a todas as outras medidas, principalmente, a política de preços mínimos sobre salários da administração governamental e de produtos agrícolas, por entender que se tratava de medidas intervencionistas do governo naquilo que deveria ocorrer de modo livre entre os agentes econômicos.

O fato é que o New Deal não propriamente tirou, os Estados Unidos da Grande Depressão, apenas amenizou os efeitos nocivos daquele período na vida das pessoas. 

O que realmente fez o país enfim, se livrar da crise, foi a eclosão da Segunda Guerra Mundial na Europa, onde a economia americana conseguiu reagir com o fornecimento de armas aos Aliados, para lutarem contra os nazistas alemães e as demais potências do Eixo.

Por outro lado, foi o pós-guerra que acabou consolidando a recuperação da economia norte-americana, através da implementação do Plano Marshall, para reconstrução econômica da Europa; financiada e conduzida pelos Estados Unidos, com programas inspirados nas ideias keynesianas do New Deal. 

É exatamente nesse momento da história, que Milton Friedman começa a se destacar, já como professor da Universidade de Chicago.

Nos anos 1950, Friedman publica seus primeiros estudos em contraposição à função do consumo de John Maynard Keynes, sugerindo a Hipótese da Renda Permanente; o principal diferencial do estudo de Milton Friedman com relação ao de Keynes, é a observação de que a alteração permanente da renda dos consumidores é o que impacta nas mudanças definitivas sobre o consumo. 

O estudo de Friedman sobre o comportamento do consumo, explica as falhas técnicas de gerenciamento de demanda keynesianas. Desse modo, a renda é vista como componente permanente (previsto e planejado) e de outro transitório (inesperado). Assim observa-se a renda vitalícia individual, não apenas sua renda atual como parâmetros que determinam tendências de consumo.

Universidade de Chicago, onde Milton Friedman se especializou em 1933 e depois se tornou professor em 1947 - Foto: Divulgação.

Mais tarde, outro estudo conduzido por Milton Friedman lhe daria ainda mais projeção mundial, o qual ficou conhecido como teoria monetarista, baseada no controle de oferta da moeda em circulação numa economia. Isso porque concluiu-se que a oferta de moeda era insensível às taxas de juros.

Para Friedman e Anna Schwartz a oferta de moeda é determinante em uma economia, pois tanto pode promover crescimento no ritmo de atividade econômica (PIB - Produto Interno Bruto), quanto no comportamento de preços e da inflação, de um modo geral. Os monetaristas entendem a necessidade de uma política monetária estável ao trazer equilíbrio para as duas vertentes econômicas.

No livro "A Monetary History of the United States" (Uma História Monetária dos Estados Unidos), os autores apontam que a Grande Depressão dos anos 1930 poderia ter sido evitada ou mitigada, caso o Federal Reserve (o banco central americano), adotasse uma política monetária expansionista, isto é, elevando as emissões e com isso, a circulação de papel moeda na economia.

Na ponta oposta, quando a inflação dá sinais de descontrole, a política monetária contracionista é aplicada via taxa de juros, onde o custo do dinheiro via mecanismos de concessão de crédito, fica mais caro e em consequência disso, gerando maiores dificuldades no acesso de empresas e pessoas ao dinheiro. 

Com isso, ocorre a inibição do consumo, reprimindo a demanda, o que reduz a inflação; além disso, a redução do déficit fiscal também deve ser observada, ou seja, o governo deve reduzir os gastos para que as despesas possam ao menos, ficarem mais próximas das receitas.

Em última análise é o que mais se aproxima do caso brasileiro, desde a implantação do Plano Real, há trinta anos. Sendo este, o único mecanismo de controle da inflação do qual se faz uso e que prejudicou sensivelmente, os níveis de crescimento da economia brasileira ao longo do período, sem que outros instrumentos pudessem ser usados para se evitar estagnação econômica. 

Desse modo, precisamos entender as duas principais razões para o descontrole inflacionário de uma economia nacional: o déficit fiscal (receitas com a coleta de impostos menores que as despesas).

E o déficit no balanço de pagamento (o saldo de tudo o que entra e sai em moeda estrangeira de uma economia), seja via exportações, importações, lucros remetidos ou recebidos por empresas, investimentos, etc.

Trata-se portanto de questões mais estruturais e conjunturais, que passam por:

  • reformas econômicas (criação de novo modelo previdenciário, tributário e redução de burocracias); 
  • políticas de apoio governamental a setores estratégicos da economia (tais como de tecnologias sobre processos produtivos industriais); 
  • investimento privado (para Formação Bruta de Capital Fixo -indústrias, máquinas, infraestrutura -de energia, portos, aeroportos, rodovias e transmissão de dados; galpões de uso industrial ou logístico etc.; 
  • educação; 
  • qualificação de mão de obra (com mecanismos de aferição de aumento contínuo e progressivo dos níveis de produtividade per capta do trabalhador), para que os produtos brasileiros ganhem competitividade no mercado exportador internacional. 

O país precisa assim, aumentar o investimento em diversas áreas, porém, sem poupudas taxas de poupança interna -que é todo o estoque de dinheiro disponível no sistema financeiro nacional (público ou privado), que poderia ser disponibilizado ao crédito- que é muito baixa, não há como se fazer investimentos em uma margem segura, sem que provoque descontrole inflacionário. Ou atrair capital estrangeiro para isso.

Edifício sede do Banco Central em Brasília: desde a implantação do Plano Real, há trinta anos, política monetária brasileira adota preceitos liberais defendidos por Milton Friedman e a Escola de Chicago - Foto: Adobe Stock.

Este é o maior gargalo econômico brasileiro, pois sem resolver o problema da poupança interna, não haverá recursos para investimentos, sem que o governo aumente o gasto, aumentando o déficit fiscal.

O legado de Milton Friedman no Brasil vem sendo seguido, quase como que uma doutrina religiosa, mas com relativo e parco sucesso, pois até o presente momento, se limitou apenas ao controle da inflação pela via das políticas monetária e fiscal.

As escolas de pensamento econômico antagônicas a Friedman

Assim como John Maynard Keynes deu origem à Escola Keynesiana, Milton Friedman também é o pai do que se convencionou chamar de Escola de Chicago; as duas escolas de pensamento econômico são antagônicas, o que gera uma certa dicotomia entre seus iniciados. 

Outras linhas doutrinárias de estudo econômico surgiram antes dos keynesianos e dos liberais de Chicago; as mais famosas são: a Escola Clássica, originária de Adam Smith; a neoclássica, influenciado por vários nomes como Carl Menger, Willian Stanley Jevons e Irving Fischer. 

Além disso, existem a Escola Austríaca capitaneada por Ludwig Von Mises, e Friedrich Hayek, e a Escola Schumpeteriana que tem como mentor a figura de Joseph Schumpeter, fortemente influenciado pela Escola Austríaca, porém, com uma pegada um pouco mais desenvolvimentista, observada pelo lado do planejamento estratégico. 

Apesar de também ser de orientação liberal, a Escola Austríaca rivaliza em ideias com relação à Escola de Chicago, que tem como patrono, a figura de Milton Friedman.

Através disso, se antes quase todos os economistas brasileiros se diziam keynesianos, hoje essa realidade mudou drasticamente, com a maioria se dizendo mais identificados como "ortodoxos", de orientação liberal da Escola de Chicago, adotando uma base de pensamento mais pró-mercado e com a menor intervenção estatal possível.

O fim do padrão ouro-dólar

O padrão-ouro foi instituído em meados do Século 18 pelo britânico David Hume, em função de sua teoria quantitativa da moeda, chamada de "fluxo das moedas metálicas" para dar lastro de valor a títulos, notas ou letras emitidas pelos bancos a metais nobres tais como o ouro e a prata.

Foi adotado também no final do Século 19 por países como Reino Unido e Estados Unidos, que fizeram a conversibilidade de suas moedas a correspondência com os respectivos minerais. Após os Acordos de Bretton Woods em 1944, principalmente com a institucionalização dos bancos centrais, o padrão ouro foi adotado para que o dólar se tornasse reserva global de valor. 

Com os crescentes gastos impostos pela guerra no Vietnã, a situação fiscal dos Estados Unidos se complicou sensivelmente, e a cotação do dólar frente a onça troy do ouro, se distanciou cada vez mais.  

Para contornar isso, por sugestão de Milton Friedman ao presidente Richard Nixon, o governo dos EUA, anunciou em 1971, o fim do padrão ouro-dólar, devido também, à redução das reservas cambiais em dólar da parte de algumas economias europeias, como a França.

Milton Friedman, à esquerda, o presidente Richard 
Nixon, ao centro e Arthur Burns (diretor do Fed), 
durante anúncio do fim do padrão ouro-dólar - Foto: 
Associated Press/ AP.

Desde então, o próprio dólar adotou o status de "moeda fiduciária" e por assim dizer, uma "commodity" (ou mercadoria); desse modo, a moeda norte-americana adotou cotação própria nas praças internacionais de câmbio, concorrendo com o próprio ouro como opção de investimentos no mercado de capitais. 

Alguns economistas ligados à Escola Austríaca, portanto críticos das políticas econômicas defendidas por Friedman, chamaram o fim do padrão-ouro, de "geringonça"

Algumas ideias de Friedman 

Em 1977, após 30 anos de serviços prestados como professor da Universidade de Chicago, Milton Friedman se aposenta e depois se muda com sua esposa para a Califórnia, assumindo o posto de acadêmico convidado do Federal Reserve (o banco central dos Estados Unidos), em San Francisco, onde faleceu em 2006.

No vídeo abaixo, o pai da Escola de Chicago afirma, sem nenhum constrangimento, que a imigração ilegal deveria ser estimulada para baratear o custo das empresas com mão de obra nos países desenvolvidos. Confira: 

Friedman também foi conselheiro econômico do presidente Ronald Reagan nos anos 1980; suas ideias se tornaram um compilado das ações de governo nos Estados Unidos daquele período e foram chamadas de, "Reaganomics".

No entanto, o primeiro país a implementar as teorias de Milton Friedman foi o Chile, como forma de tentar se antecipar aos problemas advindos da Primeira Crise do Petróleo em 1973. 

Por isso o Chile até hoje é elogiado pelos mais variados economistas globais, devido ao elevado nível de organização e disciplina com que conduz sua economia. Algo que deu como prêmio, sobrevida ao regime militar do general Augusto Pinochet até 1989.

Apesar disso, o Chile também é conhecido pelo elevado nível de pobreza entre a sua população, ainda que seja um dos mais baixos da América Latina; e o elevado índice de suicídios entre idosos, devido à total privatização do seu sistema previdenciário.

Assim, as ideias de Friedman, ficaram conhecidas como o conjunto de medidas que previa a redução do papel do Estado na economia, através de fortes ajustes fiscais, redução das despesas públicas, elevação da taxa básica de juros como medida de contenção dos níveis de inflação, imposto de renda sobre ganhos de capital e controle de emissão de moeda.

Foi a inauguração de um período chamado de "neoliberalismo" (pelos críticos), na economia global.

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