Pular para o conteúdo principal

Empreendedorismo nacional e liberalismo globalista kamikaze

  O mundo empresarial vive sua pior crise existencial, e desde os anos 1980 para cá, parece perdido entre o comodismo de subsídios estatais e o discurso dogmático liberal que prega o Estado como "adversário" do setor privado; esta é uma visão que contaminou o empreendedorismo, mas não ao ponto de comprometer sua sobrevivência, embora se trate ainda, de doses homeopáticas de um veneno que o sufoca aos poucos.

 Sem um mercado bancário competitivo, as empresas precisam se virar para encontrar outros meios de financiamento para seus empreendimentos; algumas apelam ainda, pela abertura de seus capitais no mercado de ações, em que lançam mão do famoso IPO (ai.pi.ou - em sua pronúncia em inglês - que quer dizer Oferta Pública Inicial), buscando assim meios de aumentar o capital de suas empresas para poderem ganhar algum fôlego em meio à redução nas vendas.

 Muitas se valendo também, de suas posições consolidadas e pelo tradicionalismo no qual estão inseridas em meio ao mercado de ações, laçam mão de debêntures (que são títulos de dívidas emitidas por empresas conceituadas), como modo de conseguirem financiamento para seguirem com seus negócios.

 Outras empresas, ainda que em parte contrariem um pouco, princípios do liberalismo, buscam subsídios públicos, não apenas com o governo federal, mas também com estados e prefeituras, os quais exigem poucas ou nenhuma contrapartida na geração de empregos (que apenas acontecem como consequência mínima desses empreendimentos privados e não como seu objetivo principal), já que algumas com elevado nível de automação em seus processos produtivos, dispensa um número significativo de funcionários.

 A história brasileira é recheada de exemplos ao redor de empresas que eram muito bem sucedidas durante o fechado regime militar a importados (principalmente no governo do general Ernesto Geisel - 1974/ 1979), onde estas recebiam subsídios governamentais, porém não exportavam, não abriam filiais fora do Brasil e só atuavam no mercado interno. Até multinacionais estrangeiras se deram bem com isso, pois só produziam refugos no Brasil, rejeitados por consumidores de suas matrizes no exterior, como no setor automotivo.

Com o fim de subsídios governamentais, empresas como a Ford deixaram o país, ainda que com eles, produzisse veículos provido de tecnologias muito inferiores àquelas de fábricas em outras partes do mundo - Foto: Reprodução.

 O resultado do comodismo veio com a falta de capacidade técnica para com a concorrência externa, principalmente após 1990 - o qual foi se agravando durante toda a década anterior - quando o governo Collor promoveu a forçada abertura da economia nacional para importados como condição imposta pelo Consenso de Washington. Desde então o Brasil passou a sofrer um grave processo de desindustrialização o qual se intensificou ainda mais, à medida que a agenda liberal vinha ganhando cada vez mais importância, em governos como FHC, Lula, Temer e o atual de Jair Bolsonaro.

 Para contrabalançar a incapacidade das empresas com a concorrência externa, passou-se a exigir cada vez mais qualificação de mão-de-obra, porém, para realidades em que não havia propriamente um cenário de competição o qual exigisse tanto dessas empresas e estas por sua vez, de seus funcionários; desse modo, empresas que só tinham atuação nacional (ou quando muito, regional), passaram a exigir inglês fluente de candidatos em seus processos de recrutamento, se nem sequer tinham mercado fora do país, como resultado do discurso liberal da globalização, e que só servia como retórica barata para isso.

 E assim a busca do "profissional perfeito" (e inalcançável), teve como principal premissa oculta, o barateamento da mão de obra, através da criação de um contingente de reserva laboral em que por mais gabaritado alguém fosse para desempenhar determinada função, era visto como pouco qualificado, enquanto nosso arcaico e falido modelo sindical, só assistia a esses fenômenos de longe, sem nenhum comprometimento, para com a legião de desempregados (e "desqualificados"), que aumentava gradualmente, à medida que a desindustrialização avançava. 

 O sistema de representação de trabalhadores no Brasil parou no tempo, pois ficou à mercê de partidos políticos ditos "populares", não se atualizando com as novas metodologias produtivas como o Volvismo sueco, o qual busca aumentos constantes de produtividade nas fábricas como premissa fundamental para aumentos salariais das categorias representadas, cedendo espaço para o Toyotismo do "just in time" japonês, e que em parte, também explica a decadência da economia do Japão em conta desse fenômeno.

 Assim começaram a surgir os primeiros empreendedores nacionais financiados por suas próprias motivações pessoais; muitos não obtiveram sucesso (não que tivessem um restrito ou indevido domínio técnico em suas atividades - já que somente esses pré-requisitos, não são determinantes na garantia de que sejam bem sucedidos em seus negócios), mas a competição desleal de veteranos no mercado, a falta de crédito e a burocracia incidente em maior escala sobre novatos (apesar das facilidades do Simples). 

Em manchete no site do jornal O Globo, a notícia de que empresários defendem a volta do Ministério da Indústria e de políticas de incentivos ao setor - Foto: Reprodução/ Oglobo.com.

 Outros empreendedores também surgiram e obtiveram maior sucesso por terem como ponto de partida, o fato de serem herdeiros de consideráveis somas em dinheiro ou patrimoniais, que lhes permitiram alguma vantagem competitiva, propiciando maiores chances de sucesso.

 Desse modo, com pequenos empreendimentos pipocando pelo país, grandes empresas engoliram concorrentes, fechando unidades ou transferindo outras para locais menos desenvolvidos, com mão de obra barata (e não tão qualificada assim, como exigido em suas unidades de origem), além de contarem com incentivos fiscais e com isso demitindo mais gente ou (empregando menos - com a alta tecnologia de automação de novas plantas produtivas construídas nessas localidades); que por sua vez empurra mais pessoas para o subemprego gourmetizado, chamado "empreendedorismo".

 De repente com isso, houve a descoberta de que a globalização não melhorou em nada o padrão de vida ocidental e que pelo contrário, acabou transferindo não apenas empresas, como também tecnologia, conhecimento e progresso para o oriente e em parte para outros países, não propriamente considerados "ocidentais". Assim a China passou a incomodar e ao lado dela, os demais países do chamado "Brics", grupo formado por Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul. 

  Por outro lado, as economias centrais que tradicionalmente ditaram modelos e formas de desenvolvimento às demais, como cartilha pronta e infalível, à qual os países do Brics citados acima (em maior ou menor escala, não a seguiram apropriadamente), passaram assim, a se sentirem incomodados e até "ameaçados" em seus papéis de protagonistas no cenário global, desde a Segunda Guerra Mundial. 

Por vezes, o empreendedorismo é confundido com formas 
de sobrevivência alternativas como bico ou o subemprego -
Foto: Reprodução.

 Através de tal constatação, o termo globalização caiu em desgraça e passou a ser referido de modo pejorativo ou depreciativo como "globalismo", pelo simples fato de o protagonismo ao redor desse processo, estar se dando em maior escala, principalmente por meio de China e Rússia e em menor proporção por Índia, Brasil e África do Sul. Agora esses países são atacados de um modo ou de outro, acusados e perseguidos, apenas porque seus níveis de desenvolvimento passaram a incomodar as potências tradicionais. 

 Algo ainda não percebido ou reconhecido por nossa mídia "ocidentalizada" (que porém não é considerada como parte do Ocidente), é que tais países que controlam organismos dos quais fazem parte como o FMI, o Banco Mundial, a OCDE, a Otan e a União Europeia, não aceitam e não reconhecerão esforços de países como o Brasil em suas empreitadas pelo desenvolvimento com a consequente redução da pobreza. 

 Assim, o Brasil começa a ser atacado por sua suposta negligência ambiental, que estaria provocando desequilíbrios ecológicos observados em tragédias naturais, com florestas do primeiro mundo incendiadas, em alegadas ondas de calor das quais são considerados como vítimas (e não pela irresponsabilidade local de suas populações - assim como apontado no caso do Brasil); em conjecturas que desprezam o bem estar de pessoas residentes na floresta Amazônica, às quais também anseiam pelas facilidades tecnológicas contemporâneas observadas desde longa data em países desenvolvidos. 

 Por essa razão, a pauta do desenvolvimento praticamente "morreu" na imprensa brasileira e com ela, aquilo que seria determinante para o sucesso de pequenos, médios e grandes negócios no país.

 Tudo o que a imprensa defende como parte da agenda nacional, são reformas unicamente do ponto de vista econômico e que não agregam em nada, a necessidade de aperfeiçoamento do ponto de vista institucional das regras magnas que regem a Nação; exatamente por isso defendem uma democracia difusa e sem conteúdo, em que sua essência não é a participação da maioria, mas sim, o pleno controle de uma pequena parte sobre o todo. Um mínimo de intelectuais, artistas, acadêmicos, empresários e banqueiros concentrados na Região Sudeste, mais especificamente no eixo Rio-São Paulo.

 Além disso, as reformas que só atendem a interesses de grandes grupos privados, têm por outro lado, a necessidade trazida pela imprensa em meio (inclusive, de reformar outras reformas já feitas), além de criticar ainda, o excesso de alterações constitucionais que só atenderam ao setor econômico privado em detrimento de uma ampla maioria à qual não viu resultados tangíveis dessas reformas em suas vidas.

Exemplar de um troleibus (ônibus movido por cabos elétricos) produzido pela extinta Mafersa, à qual em seu início se especializou em equipamentos ferroviários para passageiros como trens e metrô e depois passou a atuar no seguimento urbano rodoviário; empresa que contava com grandes subsídios estatais na década de 1970, não conseguiu sobreviver sem eles e à concorrência externa, vindo a falir em 1999 - Foto: Wikipedia.

 Sendo assim, o que está em jogo ao redor dessas reformas é o controle sobre o orçamento público nacional por parte de pequenos grupos dominantes, tendo em vista, que até o Congresso Nacional, legitimamente eleito pelo povo, está "proibido" de se utilizar dos recursos públicos, para assistir populações representadas pelos parlamentares que nele estão inseridos.

 Nesse contexto, o que se observa com expressões pejorativas como "orçamento secreto" ou "PEC eleitoral" é a neutralização da essência democrática brasileira, que tem como parte de iniciativa, a figura da imprensa, encarregada da elaboração de rótulos ou termos que no fim, visam descreditar a política; embora a imprensa também tenha ao lado dos grupos dominantes os quais representa, defendido o Manifesto pela Democracia, contra os supostos atos golpistas de defensores do governo do presidente Jair Bolsonaro.

 Uma democracia que como dito, não engloba o todo, mas apenas partes de uma sociedade melhor estruturada, à qual apesar de discursar o oposto, demonstra de modo latente e quase imperceptível que não está interessada no desenvolvimento do Brasil e muito menos em sua democracia, mas apenas, nos lucros de seus negócios e no privilégio em continuar ditando pautas a serem discutidas no país, mas que no fim, convergem apenas ao redor de seus próprios interesses. 

 Uma democracia que prega o empreendedorismo do "vire-se" e ou como aquele de loteria, onde a sorte é lançada em investimentos, os quais mais se parecem apostas. 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Rio Verde moderna

 Dando seqüência ao último post, em comemoração ao aniversário de 164 anos de Rio Verde, no próximo dia 05 de agosto, vamos iniciar de onde paramos: a década de 1960, quando relatei que a cidade enfim, inebriava-se num breve período onde a dupla Mauro Borges (governador do Estado) e Paulo Campos (prefeito), inaugurava uma fase onde o centro de Rio Verde passava por sua modernização.   Ruas de terra ou calçadas com paralelepípedo em basalto davam lugar ao asfalto. O paralelepípedo teve uma outra destinação, e foi usado como guias de sarjetas das novas ruas recém-pavimentadas.  Os postes que sustentavam a rede de energia elétrica de aroeira, deram lugar a modernos postes de concreto e uma iluminação pública mais potente ganhava as ruas da cidade. Tudo da energia provida de Cachoeira Dourada.  Conta-se que a primeira rua a ser pavimentada foi a Rua João Belo, (atualmente, Rua São Sebastião no centro antigo de Rio Verde). E o asfalto ficou tão bom, que a necessidade de recapeamen

Um nome estranho; um bairro que nasceu para ser "setor"

Para quem já se 'cansou' de ler sobre a história do nosso município que nesse finalzinho de agosto -celebra seu mês de aniversário-, deve portanto saber, que a chamada "arrancada para o desenvolvimento" de Rio Verde, se deu a partir dos anos 1970.  O certo, é que a cidade seguiu o ritmo do tal "milagre econômico" dos governos militares daquela época. Mas sem dúvida, o que foi determinante em tudo isso, se deu com a fundação da Comigo, no ano de 1975.  Desde o final da década até o início dos anos 1980 porém, a expansão urbana de Rio Verde também sofreu um elevado aumento, sendo que essa situação provocou o surgimento de bairros cuja a única infraestrutura disponível, se deu somente na abertura de ruas e o traçado das quadras.  A especulação imobiliária por parte dos herdeiros de propriedades antes rurais, que margeavam os limites urbanos da cidade, abriu espaço para bairros onde atualmente se verifica sobretudo, a apertura das ruas, em que muitas delas nã

Globalismo Vs nacionalismo e o futuro da humanidade

O mundo sempre viveu conflitos entre interesses privados e coletivos; mas apesar de ser um termo novo o globalismo por sua vez, teve papel preponderante nisso, logicamente adaptado aos contextos de suas épocas.  Antes, na antiguidade, as primeiras civilizações já eram globais e dominavam outras, pela força. Não que hoje os métodos de dominação tenham mudado, porém para isso, se tornaram mais sutis, e não menos violentos.  Desse modo, a sensação de violência sofrida é que pode demorar algum tempo para ser sentida; o que não ocorre de maneira uniforme por todas as populações subjugadas.  Sem falar na corrupção, a maior aliada dos dominadores contra os subjugados. Assim, pessoas do lado dos oprimidos, se veem partidárias de seus opressores, em nome de possíveis vantagens pessoais adquiridas. Alexandre, o primeiro grande conquistador, certamente de modo involuntário, foi o primeiro a difundir o globalismo, através de seus exércitos. Porém, conforme diz sua história, ele teria chorado por n