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Francisco, da filosofia ao papa reformador da ação

 Há pouco mais de um mês para a realização da Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro, o papa Francisco vem surpreendendo em sua maneira diferente e peculiar com que vem conduzindo a Igreja Católica nesses primeiros meses de papado. Seja em suas homilias na Basílica de São Pedro ou nas audiências gerais que concede sempre às quartas-feiras no Vaticano, o papa tem demonstrado certa insatisfação com a conduta de parte dos cristãos católicos de orientação mais conservadora e de certa maneira apática.

  Se muitos ainda esperam reformas na Igreja, ou sugerem a necessidade delas, é importante lembrar que a Igreja não necessita de reformas, simplesmente precisa apenas, implementar sob o ponto de vista prático, todas as mudanças já realizadas por meio dos documentos produzidos pela reunião de seus bispos e essencialmente aquelas relacionadas às reformas conquistadas no Concílio Vaticano II. Por sua vez, Jorge Bergoglio se mostra bastante aberto e receptivo na tarefa de tornar na prática, tudo o que foi definido pelos bispos do mundo inteiro há pouco mais de 50 anos, no concílio convocado por João XXIII e concluído por Paulo VI.

 A reivindicada neutralidade política da Igreja - algo que nunca foi exatamente comprovado -, vem gradualmente sendo desmistificada pelo papa. Entre declarações aqui ou ali, e mesmo não tendo publicado ainda nenhuma encíclica, o Sumo Pontífice tem exortado muitos cristãos católicos a saírem do armário e partirem para a militância política. 

 Em um encontro com crianças de escolas jesuítas, Francisco mencionou a necessidade do católico de se empenhar na política ao afirmar que "é uma obrigação dos cristãos que não podem daí, lavar as mãos como Pilatos", fazendo alusão ao episódio do Evangelho de João em que o governador romano da Judeia Pôncio Pilatos lava as mãos (em sinal de neutralidade) sobre o destino requerido pelos judeus em que reclamavam a condenação de Jesus à morte. E o papa acrescentou: "A política é a forma mais elevada de caridade, pois ela procura o bem comum".

 Outra clara demonstração de que o papa está alerta aos acontecimentos no mundo, se deu por conta da preocupação do Pontífice com a crise econômica que atinge a Europa e mais especificamente a Itália, afirmando que é preciso "saber ler a crise" onde o valor humano no meio econômico é visto como secundário em consequência do próprio capital, numa crítica indireta às medidas de austeridade tomadas pelos governos europeus para contornar a crise iniciada em 2008.

Bergoglio, muito mais antenado que os antecessores

 O papa porém com certa regularidade e constância, tem mostrado ligeira radicalidade em seus discursos, insistentemente chamando a atenção ao que ele mesmo classificou como a predominância dos "fiscais da fé", ou as figuras concentradas dentro dos recintos eclesiais que mais se preocupam com as formalidades eclesiais e obedecendo a firme posição em concordância oficial com a Igreja de condenação ao aborto, contudo, não prestando a devida assistência na fé aos que a Igreja procuram. 

 O papa chamou a atenção porém, para o fato que mesmo ocorrendo o contrário, levando-se em conta uma mãe que dá continuidade à sua gravidez, a incorreção em uma condenação discriminatória da parte da própria comunidade, ao negar o batismo de uma criança filha de uma mãe solteira - e que nas palavras do papa: "teve a coragem de continuar a gravidez" -, meramente em razão da ausência do cumprimento de um protocolo formal através do sacramento do matrimônio da mãe (onde a criança fica impedida de ser batizada), constitui como o ato que "afasta as pessoas da Igreja". Isto é, os "fiscais da fé" que fecham as portas da Igreja, justamente para as pessoas que mais precisam dela.

 Mas na noite desta segunda-feira (17), o papa ainda foi mais enfático ao exortar os católicos a serem cristãos "revolucionários" e que assim tenham a coragem de propagar e difundir o Evangelho por meio de seus testemunhos, ou seja, da própria prática da fé, e em suma, com menos discurso e mais ação. 

"Hoje um cristão, se não for revolucionário, não é cristão!" disse o papa durante o Congresso Eclesiástico da diocese de Roma. E criticou o que enumerou como comunidades cristãs "fechadas" às quais certamente se referiu por conta da preocupação dessas comunidades, apenas com as "ovelhas" de seus apriscos, ao citar a passagem do Evangelho do pastor e suas 99 ovelhas e onde ele nota a falta de uma, e então começa a procurar por essa que falta. 

 Afinal o papa com tantas mensagens indutivas à evangelização de ação necessariamente parece conduzir a Igreja para uma militância religiosa, e em torno dela também, a de uma participação política e que ao mesmo tempo vem de encontro à mensagem de libertação do homem contida nos Evangelhos - mas não apenas sob o ponto de vista de seus atos pecaminosos -, como também, de sua condição de servidão humana aos caprichos e desígnios das condições econômicas impostas pelo sistema.

 Portanto, ao lembrar que em pouco mais de um mês estará no Brasil, e dada a repercussão dos protestos contra o aumento das passagens de ônibus em todo o País na imprensa mundial, o papa vai dando o tom de como será sua passagem por aqui, num claro sinal de que a Igreja moderna já devidamente reformada desde o Vaticano II, não mais se compactua com cristãos de ocasião, mas exorta e instiga os mesmos a lutarem por um mundo mais justo. 

 E mais uma vez numa referência indireta - ou quem sabe involuntária -, à Jornada Mundial da Juventude no Brasil quanto às constantes críticas recorrentes ao comportamento dos jovens, o papa brincou com aqueles que se queixam dos jovens, dizendo: "Ah, os jovens!".

 Para quem ainda acha que a Igreja precisa de reformas, o papa inspira que elas há muito já ocorreram e que o seu papel será apenas fazê-las na prática.        

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