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Reforma tributária possível? Não! A reforma do "vamos ver no que vai dar"

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC-45/2019), que se refere à reforma tributária, passou em dois turnos na Câmara dos Deputados, tendo votação concluída no último dia 07 de julho com grande margem de vantagem por 382 votos favoráveis e 118 contrários.

Mas mudar o modelo de arrecadação de impostos de todos os entes federados com tantos interesses em jogo, não é tarefa fácil para nenhum governo. Tanto que este é um tema ao qual vem sendo discutido há 30 anos, sem nem ao menos ter havido uma bem sucedida votação inicial, como a ocorrida no início deste mês. 

Desde 1993 (ano em que houve os preparativos do Plano Real, lançado em julho de 1994), se fala em reforma tributária no país.

O cerne da proposta está longe da gritante necessidade de se promover justiça tributária no Brasil, para que cesse, a realidade regressiva da tributação brasileira em que os mais pobres acabam sempre comprometendo mais de suas rendas com impostos.

Apesar de contar com estudos de entidades ligadas ao setor, a reforma tributária, não resolve o problema do repasse de impostos da indústria em suas exportações; algo que talvez o conselho federativo resolveria com a exigência do pagamento dos créditos tributários às empresas - Foto: Reprodução/ G-hum.

Enquanto isso, as classes mais abastadas, comprometem menos (ou quase nada) de seus proventos sobre impostos pagos aos respectivos governos: municipais, estaduais e federal.

A ideia principal gira ao redor da simplificação no recolhimento de tributos sobre o consumo (principalmente para as empresas) com a fusão de um imposto federal (IPI), um estadual (ICMS) e outro imposto municipal (ISS).

Além disso, duas contribuições de competência da União (PIS e COFINS), seriam mescladas em um único meio de tributação, o IVA (Imposto de Valor Agregado).

Exceções 

Outro ponto da reforma, é zerar os impostos sobre itens da cesta básica -algo que como o próprio nome diz, se trata de uma cesta de produtos básicos de primeira necessidade (de modo essencial, alimentos). 

De acordo com reportagens do jornal O Globo deste sábado (22), esta é outra questão que pode causar ainda mais controvérsias. Necessariamente não se sabe sobre quais itens, comporiam com exatidão, a cesta básica; 

Além de não haver um padrão nacional, há 27 cestas básicas diferentes no país (uma para cada estado da federação). O que torna a situação bem mais complexa. 

Desde a materiais de construção como, telhas, a até queijos finos importados ou chantilis, fazem parte do que se entende como "básico" na alimentação das famílias, em boa parcela dos estados brasileiros. 

O problema é que dentre as propostas de padronização da cesta básica nacional no Congresso, também estão aquelas que querem incluir ainda, outros produtos exóticos ao conceito de "básico". Tudo para incluir itens os quais nada têm a ver com aquilo que é consumido pelas faixas de renda mais humildes.

Camarão, filé mignon e iogurte grego, estão entre mercadorias às quais podem ser incluídos na nova cesta básica nacional. Ou seja, produtos essencialmente consumidos pelas classes média alta e rica, que teriam tributação zerada e na prática perpetua injustiças tributárias onde os ricos continuam poupados de impostos.

Além disso, setores da economia brasileira, brigam por manter ou conquistar privilégios tributários por meio dos chamados "jabutis" (artigos incluídos em projetos de lei ou reformas, que beneficiam determinados agentes econômicos). 

Ocorre que quanto mais privilegiados houver, mais a alíquota geral do IVA poderá se elevar.

Estima-se que se todos os privilégios tributários aprovados na Câmara, forem mantidos no Senado, a alíquota geral do IVA no Brasil, poderá chegar entre 28% e até 30%. O que faria o país ter o maior imposto sobre o consumo do mundo. Desse modo, não estaremos aprovando a reforma possível, mas aquela do "vamos ver no que isso vai dar".

 

    Extraído do jornal Folha de S.Paulo

Controvérsias

Um dos nomes mais proeminentes do meio acadêmico econômico, o professor Marcos Cintra, tem se manifestado expressamente contra a reforma; uma de suas críticas é que o modelo do IVA não seria adequado para um país de regime federativo como o Brasil; sendo portanto, melhor aproveitado em países com natureza de Estados unitários.

Outra crítica do professor Cintra, é a formação do conselho federativo, o qual ficaria encarregado de representar os estados, além de arrecadar e fiscalizar os recursos. Seria uma autarquia paralela com a mesma função que a do Tesouro Nacional, caracterizado pelo professor da Fundação Getúlio Vargas, em uma roda de discussões na Jovem Pan News, como algo "esdrúxulo".

Na visão de Marcos Cintra, o conselho federativo é estranho pois concentrará toda a arrecadação de impostos de todos os entes federativos (estados e municípios) para depois ser distribuído de acordo com o princípio do destino, onde os recursos são liberados, desde que os entes federativos façam a liberação dos créditos tributários.

O professor reconhece que este problema é real, mas a forma sobre como se propõe constituir o conselho, se daria de maneira muito centralizadora, concordando que cada estado deveria ter o seu próprio conselho; o risco no entanto, pondera ele, que com esta solução, os estados reteriam os créditos tributários, ocorrendo o que já acontece com o ICMS atualmente, nas transações interestaduais.

Mas entre os defensores do imposto único, a grande vantagem será a transparência, conforme relata o deputado Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR); um veterano nas discussões sobre a reforma tributária na Câmara Federal e que assumiu recentemente o cargo, após a perda de mandato de Deltan Dallagnol.

Sem dúvida o IVA trará mais transparência ao arcabouço tributário brasileiro, uma vez que ficará claro, o que sempre ficou evidenciado de modo tácito e latente, de que o consumidor, sempre foi o maior financiador do Estado Nacional em todas as suas configurações federativas; principalmente os assalariados mais pobres, devido ao problema da regressividade tributária sobre o consumo.

O deputado paranaense, Luiz Carlos Hauly, é o maior defensor da reforma tributária na Câmara dos Deputados - Foto: Fábio Rodrigues Pozzebon/ Agência Brasil/ Via Correio do Povo.

Mas a principal crítica à qual deveria ser feita com relação à reforma, certamente se dá na ausência de uma proposta tributária que privilegie a competitividade da indústria para exportação de bens elaborados, ainda que conforme citado pelo professor Cintra, parte das propostas em apreciação no Congresso, tenha partido da instituição que representa o setor no país, a Confederação Nacional da Indústria (CNI).

A reforma em si praticamente não resolve o problema do repasse de tributação ao consumidor final; e os clientes no estrangeiro, não gostarão de pagar impostos no lugar dos industriais brasileiros. Algo que talvez já esteja previsto no modelo de pagamento de compensações tributárias do conselho federativo.  

Como funcionaria o novo modelo tributário nacional

A proposta das PECs 110 (Senado) e 45 (Câmara), projetam um modelo dual de arrecadação de impostos, ou seja, um sistema de competência exclusiva da União e outra, dos estados -numa tentativa de respeitar o princípio da autonomia dos entes federativos.

O IVA seria subdivido em dois impostos: o CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) de natureza federal e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), sob o cuidado dos estados. O primeiro, o CBS, seria a junção de todos as contribuições federais (PIS e COFINS), enquanto o IBS, seria a junção do ICMS estadual com o ISS, municipal.

Foto: Arte/ Revista Oeste.

Outro diferencial, seria a cobrança do IPI, como imposto "seletivo" e que incidiria sobre itens de consumo, considerados "pecaminosos", ou que se consumidos por longos anos, prejudicam a saúde, tais como cigarros, bebidas alcoólicas, chocolates, salgadinhos e outros tipos de alimentos ultraprocessados.

Regulamentação

De acordo com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, após aprovado todos os trâmites da reforma tributária, a regulamentação ocorreria até o fim de 2024, o que porém, chocaria com o calendário eleitoral dos municípios. 

Já outra reforma complementar, a do Imposto de Renda, seria apresentada pelo governo até o fim deste ano; além da tributação sobre lucros e dividendos, transações de Juros sobre Capital Próprio, pago pelas empresas aos sócios, e a taxação dos fundos financeiros exclusivos, também estariam incluídas.

Há ainda, proposta que inclui a taxação sobre a propriedade de aviões executivos e embarcações de luxo, como um modo de compensar a grande carga tributária sobre o consumo e parte das exceções e privilégios com os jabutis da reforma.

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