A sociedade brasileira vive uma crise de identidade moral de cunho gentílico nacionalista sem precedentes em sua história; tudo porque se adotou o esteriótipo nacional dentro dos mais ardilosos preconceitos identificados em costumes, hábitos ou vícios sociais atribuídos a determinados grupos da sociedade de diversas partes do Brasil. E o pior, tudo isso não partindo necessariamente de um falso conceito formado da ignorância por quem busca conhecimento, mas exatamente por quem o repassa; ou o que podemos chamar de doutrinação perpetuada do senso comum.
E de repente dessa forma numa aula de uma determinada turma do primeiro período de Direito, se torna razão para um embate sociológico, em que o docente não perde chances os quais considera imperiosas, em desferir os mais mortais dardos venenosos de preconceito social de que se possa ter concebido. Porém, tudo dentro de um falso ambiente de respeito entre as diferenças de opinião.
Logo, exemplos de comportamentos e hábitos genuínos de pessoas pertencentes a bairros nobres e de periferia são lembrados; do goiano confrontado ao de paranaenses; de fluminenses ao de paulistas. Estatísticas vazias (e sem fontes), às quais são aludidas a um determinado estado do Nordeste do país, em que os elevados números de violência contra a mulher registrados, podem, na concepção de alguns, ser atribuído a uma certo predomínio comportamental e cultural hereditário das vítimas.
Portanto, ocorrências no meio social os quais explicariam talvez, a naturalidade com que a violência contra a mulher é vista naquele meio; embora os dados mencionados, fossem objeto de registros de boletins de ocorrência e que de certa forma por isso, contradizem essa insinuação ou outras explicações tais como políticas governamentais em torno da média do tempo escolar de um goiano da qual pode girar entre 13 ou 17 anos (mas que está dentro da média nacional), em comparação ao do gaúcho, que de acordo com o preletor é de dez anos mais.
Estas observações, mais prejudicam uma relação harmônica em sala de aula e fomentam determinados preconceitos, do que ajudam na superação dessa vicissitude brasileira de apontar sempre aos outros, falhas peculiares providas de comportamentos e hábitos culturais de vida - dentro da concepção de Jean-Paul Sartre em que diz: "o inferno são os outros" -, quando se estuda a população de forma 'fatiada', como mesmo mencionado pelo mestre, o qual parecia buscar com isso, a dissimulação de algum tipo de humilhação sutil a um possível indivíduo o qual pode lhe soar antipático.
É realmente preocupante quando formadores de opinião, alienam e prejudicam ainda mais o entendimento da necessidade pela busca de uma maior harmonia social em nosso país, o qual vem evidenciando uma sociedade cada vez mais sectarista e segregadora e ainda atribuir tal alienação, unicamente aos meios de comunicação eletrônicos de massa.
Muito pior porém, quando o Apartheid nos Estados Unidos - contudo ligeiramente lembrada ainda, porém em bem menor proporção, a África do Sul -, parece chocar mais que o fato de haver poucos negros e pobres (a maioria portanto de pele escura ou parda em função da miscigenação étnica brasileira), nas universidades, em contraste do que podemos observar no predomínio de uma considerável e expressiva parcela deles, que se encontram em presídios superlotados.
Com isso toda e qualquer tentativa em defender a causa dos pobres e a razão de seus fracassos, se configura no que é visto como a síndrome do coitadinho. Principalmente num país o qual sua sociedade entende, que as leis penais que o regem seriam brandas demais. Já que, se questionar isso, atribui-se ao chamado "coitadismo".
Se isso não for preconceito, então sinceramente não se pode saber o que é. Se preconceitos forem exemplos distantes, vistos apenas no que se passa em outros países e culturas, ou se der somente naquilo que se discute em torno de gêneros e ainda na impossibilidade legal do aborto, a miopia discriminatória brasileira parece ser a mais nefasta, porque procura à todo custo, negar o preconceito contra não necessariamente em torno da raça ou da cor, mas sim, em função da negação da luta de classes.
Assim, na miscelânea de conceitos e preconceitos em que se mesclam aquilo que procura justificar a discriminação, podemos antever que a menção do "pobre que não sabe o seu lugar e que frequenta outros aos quais supostamente não gosta para parecer ser o que não é" (mesmo que esse citado pobre viesse a pagar pelo consumo de sua bebida, mas no entendimento de quem o critica, não tivesse sido assim), se faz confundir nesse pretexto no direito do princípio constitucional de "ir e vir", notadamente sendo limitado pela delimitação que o capitalismo sabe fazer melhor, em torno da classe e da renda.
Tudo isso soa mal por se dar justamente numa turma de Direito. Contudo não se pôde notar ainda, nenhuma menção a privilégios e mordomias das quais a classe dominante se faz reivindicadora de seu monopólio, vista também da parte de atores forenses os quais ostentam escandalosas remunerações entre salários, auxílios e ajudas de custo, além de mordomias como carro oficial com motorista, dentre outros. Sem falar em crimes de prevaricação ou vendas de sentenças da parte de procuradores e magistrados, os quais só são punidos apenas com gordas aposentadorias compulsórias.
Mesmo num curso de Direito, aonde deveria reinar "A luta pelo Direito", naquilo o que se entende de uma obra literária, em que se o indivíduo não faz uso do seu direito estaria comprometendo também todo o arcabouço de defesa e da razão de ser do próprio Direito, se confronta na simples discussão de disparidades sociais, quando não aborda o lado sombrio da exploração do homem pelo homem e que justamente por conta dos preconceitos na luta pelo direito, serem vistos como "coitadistas", já que a citação ao livro de leitura obrigatória do referido curso visa chamar a atenção para a interdisciplinariedade.
A denúncia social vista como "coitadismo" é o prato cheio para a negação do próprio Direito e por isso evidencia a plena incoerência e contradição com o que se quer repassar em torno do que verdadeiramente vem a ser a defesa do legítimo direito. Aliás, o rótulo do "coitadismo" visa exatamente isso: deslegitimar a causa da denúncia social por trás das distorções presentes em nossa sociedade.
Muito mais ainda, quando se procura evidenciar que a classe média, pague mais impostos que os pobres, pela simples razão de ser obrigada a pagar um imposto além do que os pobres pagam e quando se procura com isso, ignorar a regressividade tributária no Brasil, que sem dúvida, é uma das maiores razões para a desigualdade social em nosso país; que faz com que proporcionalmente, os pobres paguem mais impostos que a classe média (e os ricos), por deter menor poder aquisitivo comprometido naquilo que consome por meio de impostos indiretos.
É o mais vil meio de tentativa de neutralização de qualquer luta nesse sentido, no qual visa reforçar a lógica daquilo que se cobra, sem nada ter sido oferecido antes, e conceitos furados ao redor da meritocracia.
A cereja do bolo em tudo isso, se fez no manifestado incômodo dos pares de sala que repreenderam e censuraram o colega o qual manifestou-se instigado a defender em seu direito, de proferir uma denúncia social, à qual é a responsável por segregar dentro do apartheid brasileiro, a devida separação de alguém da periferia visto como uma pessoa que não pode frequentar determinados lugares, para não evidenciar com isso o rótulo da jactância de um indivíduo que deseja parecer ser o que não é; e que se ousar denunciar as distorções sociais da sociedade em que vive, pode vir a ser taxado como adepto do "coitadismo".
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