Ah que ingrata surpresa se de repente a classe mais beneficiada na última década, em vista de uma política séria de fomento com recursos públicos, descobrisse que o governo que eles se empenham tanto em derrubar, só está caindo justamente por algo feito para garantir que esses recursos fossem disponibilizados sem o risco de que nenhum tipo de contingenciamento viesse a interromper a concessão de financiamentos.
Se você pensa que o impeachment que está sendo apreciado no Senado, se deve a questões meramente ligadas a uma suposta corrupção, você está redondamente enganado.
Principalmente se você for produtor rural e está acostumado a conseguir recursos de custeio para o plantio da sua lavoura, então, seria danoso pensar que a razão ou o objeto pelo qual se faz valer o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, seja exatamente pelo fato de o governo ter garantido os recursos para que o financiamento da safra não fosse comprometido.
Dado ao teor unânime do discurso uníssono na solenidade de abertura oficial da Tecnoshow 2016, onde cada um dos oradores ao fazerem uso da palavra, tinha-se a impressão de que os líderes classistas ou mesmo os políticos ligados ao agronegócio ali presentes, mal tinham a exata dimensão do que estavam discursando, dentre seus falsos argumentos genéricos moralistas de araque, no evento que inaugurou uma das quatro maiores feiras de tecnologia e inovação rural do país, realizada entre os dias 11 e 15 do último mês de abril em Rio Verde.
O presidente da cooperativa agrícola Comigo (organizadora da Tecnoshow), Antônio Chavaglia, salientou sobre o risco de invasões a propriedades rurais em vista de uma suposta ameaça que teria sido feita pelo presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), numa solenidade dentro do Palácio do Planalto, de que caso o impeachment fosse vitorioso, haveria seguidas invasões de terra em todo o país. Porém, as garantias dadas pelo governo no custeio do Plano Safra ao agronegócio, foram sistematicamente ignoradas.
O mais inquietante de tudo isso, é que à exemplo do que ocorreu na edição da Tecnoshow de 2015 que contou com a presença de nada menos que três ministros de Estado (incluindo a ministra da Agricultura, Kátia Abreu e o então ministro da Fazenda, Joaquim Levy), na feira deste ano, só foram convidadas apenas autoridades de renome estadual, que pouco estão se lixando para o agronegócio e muito menos ainda, para os produtores rurais da região de Rio Verde.
Interessante ainda se notar a logomarca do patrocínio do governo federal e de bancos públicos nacionais, estampados logo na entrada do parque tecnológico onde é realizada a Tecnoshow e não se observar nada nesse sentido, da parte do governo de Goiás. No entanto, as críticas, os protestos e as queixas das lideranças ruralistas presentes, só se deram em relação ao governo federal.
Por certo agora, é importante se mencionar que no atual momento, muitos produtores rurais mal saibam que a presidente Dilma Rousseff corre o risco de ser afastada do governo, precisamente por conta do que se considera "pedalada fiscal" quando o governo resolve garantir recursos para o custeio do Plano Safra de 2015. Exatamente a garantia dada pelos ministros Joaquim Levy e Kátia Abreu, na cerimônia de abertura da Tecnoshow do ano passado.
A memória curta em vista do tratamento dispensado pelo governo tucano de Fernando Henrique Cardoso e a dois perdões em dívidas do setor concedidos nos governos petistas, mais a inconsequente manifestação em prol do golpe questionando o direito de escolha de pouco mais de 54 milhões de eleitores que elegeram a presidente Dilma, podem custar caro daqui para a frente, à classe produtiva rural.
Isso porque até agora, o agronegócio nem foi objeto de qualquer menção do propenso novo presidente da República, Michel Temer (PMDB), em função de qual política para o setor será adotada no futuro próximo. Contudo, isso parece não ser razão de preocupação tanto para produtores rurais, quanto a políticos que se dizem representantes da classe e muito menos em relação a lideranças ruralistas como o próprio presidente da Comigo, Antônio Chavaglia.
Até parece que as incertezas do futuro se garantem em bons prenúncios vazios de alguém que inspira uma ideologia mais próxima do gosto da elite agrária nacional e que até o momento não tem nada a oferecer, em vista do que se entende como danoso e ameaçador da parte de um governo que até agora só fez cumprir regiamente para com todos os compromissos firmados com a classe.
Mesmo que a ausência de promessas se configure na certeza de contingenciamento de recursos para o custeio de futuras safras. Afinal, trocar o certo pelo duvidoso, parece agradar o setor agrícola.
Por fim, o mais tosco e grotesco de tudo isso, são lideranças ruralistas locais, curiosamente ligadas ao PT que num passado recente, chegaram a liderar os famosos "tratoraços" (manifestações organizadas por produtores rurais que faziam uso de tratores e máquinas agrícolas como protesto contra a política agrícola do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em Brasília), e que hoje se encontram recônditos, quase não se apresentando para junto à classe a que pertencem, e nem ao menos tentarem mudar um pouco o conceito que se tem da parte dos produtores rurais contra os governos petistas.
O maior expoente dessas lideranças 'perdidas' é Flávio Faedo que mesmo pertencendo ao PT é um grande e respeitado produtor rural no município de Rio Verde. Faedo surpreendentemente em vez de brigar por uma plataforma para o entreposto de cargas da Ferrovia Norte-Sul em Rio Verde, preferiu se unir a outros produtores da região e protestar para que o consórcio responsável pelas obras de construção da ferrovia, viabilizasse um pontilhão para que a estrada rural de acesso a sua propriedade não ficasse com o tráfego comprometido em vista da passagem das futuras composições ferroviárias que naquele trecho farão uso dos trilhos.
Flávio Faedo que também chegou até a se candidatar a suplente de senador nas últimas eleições pelo PT, hoje é uma liderança rural e política que se perdeu dentro de sua inatividade no partido ao qual pertence, com vistas a se proteger da estigmatização pela qual o Partido dos Trabalhadores passou a sofrer nos últimos anos em vista do que é acusado de ter cometido dentre crimes e improbidades públicas.
E pensar que o impeachment está a passos largos justamente por algo que o próprio governo tentou garantir e assim cumprir com sua palavra para com o setor ruralista. Irônico saber disso, não?! Mais irônico ainda, é se fingir que não se sabe disso. Eis o verdadeiro caráter da classe ruralista!
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